2005/Jul/14
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Formação
A minha formação começou normalmente, estudei piano, tive aulas de piano e depois comecei no Conservatório em Viseu. Entretanto, quando deixei as aulas de piano comecei a envolver-me em coisas mais do tipo bandas rock, bandas pop e bandas jazz, a tocar com outro tipo de pessoas e a fazer essencialmente improvisação. Depois, voltei ao Conservatório e foi mais ou menos aí que decidi explorar mais a improvisação e a composição, ao mesmo tempo. Aos 18 ou 19 anos decidi tentar ver o que é que havia em termos de cursos de composição e cursos de Música em geral, mas que tivessem uma componente forte de composição, e acabei por ir para a Universidade de Edimburgo. Foi mais ou menos aleatório, mas eu sentia que devia sair de Portugal – não por alguma razão em especial mas apenas porque queria experimentar outras coisas. E acabei por ficar na Universidade de Edimburgo onde fiz um curso de quatro anos, que é um curso geral de Música mas que sempre teve uma componente forte de composição electroacústica instrumental e que serviu as minhas necessidades na altura. Depois resolvi continuar na vertente de composição electroacústica. Fiz o mestrado na Universidade de East Anglia, em Norwich. Isto foi um mestrado de um ano de investigação, não foi um mestrado com aulas, mas sim um mestrado a desenvolver um portfólio. Foi um mestrado em composição electroacústica, mas eu decidi tentar não fazer música electroacústica e fazer antes uma coisa do tipo instalação e improvisação e tentar sair, o mais possível, da tradição de música para fita, que é uma tradição forte em Inglaterra. Passei um ano a tentar fazer coisas com diferentes tipos de notação, improvisação e instalação. Depois resolvi regressar a Edimburgo onde, entretanto, chegou um professor de Arquitectura chamado Richard Coyne, que é uma pessoa que escreve muito sobre Design, Arquitectura e a relação entre o Design e as novas tecnologias. Aí surgiu a oportunidade de fazer um doutoramento híbrido, entre a Faculdade de Música, onde eu tinha estado a estudar antes, e a Faculdade de Arquitectura, principalmente nesta vertente de novas tecnologias. Passei aí então quatro anos também a desenvolver um portfólio composto de instalações e de várias peças que exploram noções de Design e noções de Arquitectura, e qual a relação destas noções face à Música, o espaço em relação à Música e as novas tecnologias em relação à Música.
Um olhar sobre a relação entre Composição e Improvisação
Eu acho que a improvisação começou seriamente talvez antes de ir para Edimburgo e ainda nos primeiros anos em Viseu, quando comecei a tocar free jazz com vários músicos de Viseu. Começámos a desenvolver uma coisa que nem é improvisação, nem é composição, é mais ou menos o que as bandas rock fazem: ensaiam determinada coisa e estudam determinado tipo de material e sabem que essa determinada coisa vai acontecer, mas que não é composta em termos de notas. Criam-se as condições para que um determinado tipo de música aconteça, mas não se criam, necessariamente, os materiais específicos que vão acontecer. E, em termos de método, acho que isso ficou. Quando comecei a fazer composições mais formais, de uma forma mais séria, tentei sempre incluir essa vertente que dá liberdade na performance (eu não gosto da ideia porque não é bem essa a razão porque faço as coisas). Mas tem mais a ver com criar as condições para que a música aconteça de uma forma que não seja ler o que está escrito, nem executar o que já foi executado antes. Uma das experiências que comecei a fazer em Edimburgo foi, por exemplo, manter colaborações com artistas plásticos. Eu desenvolvia uma notação que era gráfica mas que tinha um aspecto estético-plástico também. Ou seja, a peça era estruturada como uma composição normal só que a notação era bivalente, não era uma notação que tivesse uma referência tradicional. E esse tipo de trabalho continuei a nível de mestrado e de doutoramento. Isto tudo para dar, digamos assim, espaço e tempo a algo que eu acho muito especial, que é o momento em que uma música acontece ao vivo. Acho que não deve ser só o repetir de uma música que já existe na imaginação ou numa partitura – trata-se de um tipo de situação frágil, acho que é isso que caracteriza uma situação musical. Ou seja, é aquela sensação de uma pessoa estar a ver e a ouvir um músico no palco e a qualquer momento qualquer coisa pode “dar para o torto”, tudo pode falhar – uma corda pode partir-se, um músico pode enganar-se, há uma série de coisas que podem acontecer. Acho que são essas coisas que fazem a execução musical importante e são as únicas razões pelas quais nós ainda continuamos a ir a concertos – há uma atracção por esse tipo de fragilidade que é difícil de definir. É um perigo, mais exactamente. E eu acho que os sistemas que estão entre a composição e a improvisação usam esse perigo e fazem desse perigo parte da música, de maneira a que a execução não se torne apenas uma forma de exprimir a música que está na pauta mas seja antes uma forma de exprimir o perigo, que eu acho que é mais interessante.